O mês de março é considerado o mês das mulheres, em razão do dia 8, Dia Internacional das Mulheres, data oficializada pela Organização das Nações Unidas em 1975. Porém, a origem da data remonta à semente plantada pelo movimento operário nos Estados Unidos, Reino Unido e Rússia no começo do século XX. Luta por redução de jornada de trabalho, por melhores salários, por direito ao voto, por “pão e paz.” Temos conquistas a celebrar, mas temos muito ainda a conquistar.

Quando falamos das vidas da maioria minorizada no Brasil – termo devidamente ajustado pela jornalista Flávia Oliveira (@flaviaol) – ou seja, as mulheres negras brasileiras, as estatísticas ainda são alarmantes. E, parafraseando a filósofa Djamila Ribeiro (@djamilaribeiro1), é necessário, sempre e cada vez mais, ampliar a voz de quem tem lugar de fala. Então, hoje a Ambiental Engenharia e Consultoria amplia a voz da colaboradora quilombola Rafaela Fernandes, moradora da Comunidade Quilombola de Botafogo:

“A situação a que nós mulheres negras, vítimas do racismo e do sexismo, estamos submetidas, reflete-se nos piores indicadores em praticamente todas as áreas – educação, mercado de trabalho, acesso a bens e serviços. Nesse sentido, destaco que hoje no Brasil, 22% das mulheres negras são empregadas domésticas e apenas 23% delas têm carteira de trabalho assinada – contra 12,5% das mulheres brancas que são empregadas domésticas, sendo que 30% delas têm registro em carteira de trabalho. Esta disparidade, registrada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), também se reflete nos salários. A renda média mensal das mulheres negras no Brasil, segundo a última Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é de R$ 279,70 – contra R$ 554,60 para mulheres brancas. Em razão dos dados como esses que, na década de 1990, o estado brasileiro reconheceu formalmente, perante a Organização Internacional do Trabalho (OIT), a existência de discriminações baseadas na cor da pele ou na origem étnica dos indivíduos no meio profissional. Com o intuito de eliminar ou proibir as discriminações fundadas em gênero e raça, o governo brasileiro assinou vários compromissos internacionais neste sentido, entre ele a ratificação da Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher (CEDAW)1.

Na área da saúde os dados continuam cheios de desigualdade. Os dados do IPEA também demonstram que 46,27% das mulheres negras nunca passaram por um exame clínico de mama – em contraponto aos 28,73% de mulheres brancas.

A vida de nós mulheres negras no Brasil sempre foi de muita luta, desde a escravidão até os dias atuais. Sofremos com a discriminação e com a desigualdade. Mas nós mulheres negras e quilombolas persistimos na luta em busca de um dia termos melhores nossas condições de vida. Não podemos continuar vivendo um retrato desumano de invisibilidade e inferioridade, no qual grande parte da sociedade nos enxergue ainda como mucamas. A realidade é que nós mulheres negras somos a base da pirâmide social, sustentamos nossos filhos e cuidamos dos filhos dos patrões (a maioria deles formada por pessoas brancas de classe alta). E mesmo assim não somos valorizadas, sequer respeitadas.

Ser mulher negra quilombola e pobre é um trinômio que transmite para o senso comum um conjunto de impossibilidades. Nossa luta por direitos – à terra, ao mercado produtivo e consumidor – é estímulo para que nossas mulheres negras e quilombolas nunca desistam. E para que permaneçamos na luta pelo cumprimento das leis e direitos igualitários.

Pois como dizia minha vó Odette, ser mulher negra e quilombola é ser mulher de coragem.”

Rafaela Fernandes de Oliveira

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Fontes: https://www.ipea.gov.br/retrato/pdf/primeiraedicao.pdf
https://www.bbc.com/portuguese/internacional-60646605
https://www.inicepg.univap.br/cd/INIC_2005/inic/IC7%20anais/IC7-13.pdf

1Saiba mais em https://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2013/03/convencao_cedaw1.pdf